O Amarelo O amarelo é uma das cores mais quentes, uma das mais expansiva, a mais ardente das cores, difícil de atenuar e que extravasa sempre dos limites em que o artista desejou encerrá-la.
Os raios do Sol, atravessando o azul celeste, manifestam o poder das divindades do além. No par Amarelo-Azul, o amarelo, cor masculina, de luz e de vida não pode tender ao esmaecimento.
Pode-se dizer que existe uma afinidade profunda, física, entre o amarelo e o branco. O amarelo é a cor dos deuses: Zoroastro - significa astro de ouro brilhante, liberal, astro vivo e Vixenu - aquele que usa vestes amarelas, e o ovo cósmico brilha como ouro. É o veículo da juventude, do vigor e da eternidade divina. O amarelo é considerado cor de luz, divina ou não. O amarelo é possuidor do dourado. A luz de ouro se torna, por vezes, um caminho de comunicação nos dois sentidos, um mediador entre os homens e os deuses. Na cosmologia Mexicana, o amarelo-ouro é a cor da pele nova da terra, no início da estação das chuvas, antes que se faça verde de novo. Está então associada ao mistério da renovação. O amarelo-ouro era o atributo de Mitra na Pérsia e de Apolo na Grécia.
O amarelo é a cor da eternidade, como o ouro é o metal da eternidade. Um e outro são a base do ritual cristão. O ouro da cruz na casula do padre, o ouro do cibório (vaso sagrado onde se guardam as hóstias), o amarelo da vida eterna, da fé, se unem à pureza original do branco na bandeira do Vaticano. É também em meio a todos esses ouros, a todos esses amarelos que os padres católicos conduzem os defuntos para a vida eterna. Em diversas tradições orientais, o dos cães infernais, como o do Zend Avesta, que tem os olhos amarelos. - para melhor penetrar o segredo das trevas - e as orelhas tingidas de amarelo e de branco. Nas câmaras funerárias egípcias, a cor amarela é a mais freqüentemente associada ao azul, para assegurar a sobrevivência da alma, pois que o ouro que ela representa é a carne do Sol e dos deuses. Essa presença do amarelo no mundo ctoniano, sob pretexto da eternidade, introduz o segundo aspecto simbólico dessa cor terrestre. O amarelo é a cor da terra fértil, o que fazia com que se recomendasse, na China, a fim de assegurar a fertilidade do casal, que se pusessem em completa harmonia o Yin e Yang, que as vestes, as cobertas e os travesseiros do quarto nupcial fossem de gaze ou seda amarela. Mas essa cor das espigas maduras do verão já anuncia a do outono, quando a terra se desnuda, perdendo seu manto de verdura. Ela é então a anunciadora do declínio, da velhice, da aproximação da morte. Ao fim, o amarelo se torna o substituto do negro. Assim, para os índios Pueblo, Tewa, é a cor do Oeste; para os Astecas e Zuni, é a do Norte ou do Sul, quando associam uma com a outra dessas duas direções com os mundos inferiores. No tantrismo búdico, o amarelo corresponde, ao mesmo tempo, ao centro-raiz (Muladarachakra) e ao elemento terra, e a Ratnasambavap, cuja luz é de natureza solar. Negra ou amarela é também, para os chineses, a direção do Norte e dos abismos subterrânos onde se encontram as fontes amarelas que levam ao reino dos mortos. É que as almas que descem até as fontes amarelas, ou o yang, que por lá se refugia durante o inverno, aspiram à restauração cíclica da qual o solstício do inverso é a origem. Se o Norte, se as fontes amarelas são de essência yin, são também a origem da restauração do yang. O amarelo está associado ao negro como seu oposto e seu complementar. O amarelo se separa do negro no momento da diferenciação do caos: a polarização da indiferenciação primordial se faz em amarelo e negro - como em yang e yin, em redondo e quadrado, em ativo e passivo. O amarelo emerge do negro, na simbologia chinesa, como a terra emerge das águas primitivas. Se o amarelo é, na China, a cor do Imperador, é efetivamente por estar estabelecido no centro do Universo, como o Sol está estabelecido no centro do céu. Quando o amarelo se detém sobre esta terra, a meio caminho entre o muito alto e o muito baixo, ela não arrasta na sua esteira mais que a perversão das virtudes de fé, de inteligência, de vida eterna. Esquecido o amor divino, chega o enxofre luciferiano, imagem da soberba e da presunção, da inteligência que só deseja alimentar a si mesma. O amarelo está ligado ao adultério, quando se desfazem os laços sagrados do casamento, à imagem dos laços sagrados rompidos por Lúcifer, com a nuança de que a linguagem comum acabou por inverter o símbolo, atribuindo a cor amarela ao enganado, quando ela cabe, originariamente, ao enganador, como o atestam muitos outros costumes. A porta dos traidores era pintada de amarelo a fim de atrair para ela a atenção dos transeuntes nos séculos XVI e XVII. Desde o Concílio de Latrão IV (1215) os judeus foram obrigados a levar uma rodela amarela costurada à roupa. O Dictionnaire de Trevous (1771) garante que é costume açafroar, pintar de amarelo açafrão, as casas dos falidos.
Quando os sindicalistas chamam de "amarelo" o operário que se dessolidariza da sua classe. Eles estão, sem saber, recorrendo das mesmas fontes simbólicas em que os nazistas foram buscar na idéia de aplicar a estrela amarela aos judeus. Mas é possível que os judeus, intervendo a valorização do símbolo, vejam nessa estrela (de seis pontas), não um sinal de infâmia, mas a gloriosa luz de Jeová. A valorização negativa do amarelo é, igualmente, atestada nas tradições do teatro de Pequim, cujos atores se maquilam de amarelo para indicar a crueldade, dissimulação, o cinismo e expressam pelo vermelho a lealdade e a honestidade. Todavia, nesse mesmo teatro tradicional, os costumes dos príncipes e imperadores - indicando, aí, não a psicologia, mas a condição social dos personagens - são também amarelos. Essa utilização da cor amarela no teatro chinês leva em conta a ambivalência que lhe é própria e que faz do amarelo a mais divina das cores e, ao mesmo tempo, a mais terrestre, segundo a expressão de Kandinsky. A mesma ambivalência se encontra na mitologia grega. As maçãs de ouro do jardim das Hespérides são símbolos de amor e de concórdia. Não importa que Héracles as subtraia: elas terminam voltando ao jardim dos deuses. São os verdadeiros frutos do amor, pois que Gaia, a terra, os ofereceu a Zeus e a Hera como representante de casamento. Mas o "pomo" da discórdia (maçã de ouro, que está na origem da guerra de Tróia) é símbolo de orgulho e de inveja. Ainda na mitologia grega, as duas faces do símbolo, se aproximam do mito de Atalanta (borboleta comum da Europa), a Diana grega. Virgem agressiva: enquanto ela corre na sua aposta com Hipômenes - que tem a intenção de matar, em seguida, como fez com todos os seus outros pretendentes - cede ao irresistível desejo nela despertado pelas maçãs de ouro que o rapaz lança por terra, à frente dela. É vencida. Então, trai seus votos - mas por essa traição conhece o amor. Cada cultura traz sua própria interpretação para cada cor. Elas podem ter valor simbólico ou apenas pelo seu atrativo visual, influenciado por sensações. Mitos e histórias passaram a dar uma descrição maior sobre as cores.
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